Por Thamara Costa
Discente Bacharelado em Arqueologia
FURG – Rio Grande/RS
Essa saída de campo foi realizada no dia 19/07/12. Embarquei na lancha das 14h e a ansiedade dominava meu ser. Aproveitei a viagem para pensar qual seria o primeiro lugar que iria: Depósitos de cebola? Sindicato? PROGASA? Logo, decidi ir primeiramente ao sindicato. Lá me deparei com três moças muito atenciosas. Expliquei que pretendia trabalhar com os “ceboleiros” e umas delas disse: “Você precisa conversar com o Sr. Oracy Troina da Silva! Ainda ontem saiu uma notícia dele no jornal vou ali dentro buscar”. Disseram três locais onde poderia encontra-lo, mas não encontrei. Resolvi ir à biblioteca pública Delfina da Cunha para ver se encontrava alguma coisa a respeito da cebola, PROGASA, festa da cebola e etc.
Chegando à biblioteca encontrei a Pâmela moça que trabalha no turno da tarde e a Sueli bibliotecária. Mostraram tudo que estava ao alcance delas, me sentei em uma mesa e vasculhei todos os papéis. Encontrei informações muito relevantes para a minha pesquisa, por exemplo, um trabalho escolar onde mostra todo o funcionamento dessa indústria, e anexado junto a ele existe cópias de documentos oficiais da PROGASA. Além disso, encontrei trabalhos de conclusão de curso e também dissertações, folhetos anunciando a programação da festa da cebola e um livro intitulado “Guia informativo e turístico 1972- São José do Norte Capital Mundial da Cebola”.
Saindo da biblioteca fui procurar novamente o Sr. Oracy mais conhecido como Oraca ou Pimpão. Finalmente consegui encontra-lo saindo do sindicato e fomos até um bar que ele costuma frequentar. Chegando lá fomos até “os fundos” do bar e sentamos em uma sala e ficamos conversando. Ele já começou falando “Adoro falar, qualquer coisa tu me corta”. Perguntei se poderia gravar a nossa conversa e ele disse “Com certeza guria”. Primeiramente me identifiquei, comentei que gostaria de trabalhar com os “ceboleiros” que a questão da indústria me interessa muito… e ele já me interrompeu “a indústria? Sei tudo de lá, anota aí tenho muito coisa para falar”.
Em 1922, segundo Sr. Oracy São José do Norte recebeu o prêmio “Palma de Ouro” por ter a melhor cebola, mas pela falta de diversificação do produto todo esse prestígio, de incentivo, e de conhecimento todo esse prestígio decaiu. A cebola é o produto que dá mais kilos por hectares. Já no tempo do “Darío” entre 1964-1967 como prefeito ele cedeu um local para começar a obra da indústria com a estratégia de dar um rumo para o excedente da cebola, bloqueando a entrada desse produto e desidratando. Porém, essa ideia não teve sucesso, pois todo o processo para desidratar a cebola era muito caro e não compensava o preço final.
A fábrica no início tinha 360 funcionários revezados em três turnos de 8 horas, e Sr. Oracy salientou muito essa parte porque a PROGASA no seu auge trabalhava 24 horas. Enquanto ele falava fiquei pensando qual a relação de memória dos antigos “ceboleiros” e os atuais. Sr. Oracy disse que hoje o prédio é ocupado pela prefeitura, onde se encontra um riquíssimo gabinete. Isso me fez refletir, pois as máquinas estão lá jogadas e acredito que não tenha nenhum incentivo em usar pelo menos uma sala para contar a história da indústria e das pessoas que passaram por lá.
Nossa conversa durou quase duas horas, e além dos assuntos da cebola Sr.Oracy comentou sobre a sua vida, arqueologia, religião, gripe espanhol, Portugal porque recentemente foi lá visitar, entre outros assuntos. Despedi-me dele, disse que pegaria a lancha das 18h, agradeci ele pela atenção. Disse que pretendia voltar na próxima semana ou na outra, e ele disse que vai separar umas fotos e uns documentos da PROGASA para mostrar-me.
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Comentário:
Gostei muito do seu diário Thamara! Já no início você expressa o anthropology blue, que é a ansiedade que todos nós sentimos quando vamos à campo, principalmente no início, pois não sabemos ao certo como seremos recebidos, quais serão as dificuldades do campo.
Outra parte interessante foi a busca por materiais na biblioteca, onde você encontrou o “Guia informativo e turístico 1972 – São José do Norte a Capital Mundial da Cebola”, é importante os dados documentais históricos, mas também é interessante privilegiar a história contada pelos próprios ceboleiros, suas cônjuges ou outros atores envolvidos, sendo expressado nas narrativas do Sr. Oracy, pois como explica Halbwachs a memória individual expressa uma memória coletiva.
Parabéns pelo ótimo início de trabalho amiga!
Abração,
Cátia Simone da Silva
Discente Bacharelado em Antropologia/UFPel
Cátia, talvez você não esteja mais interessada no assunto, como uma missão acadêmica, mas quanto a mim, há interesse permanente: não é a questão dos “ceboleiros”, é tudo mais. A fábrica, não só nasceu para cuidar de TODA produção nortense (sem BR101, fretes imensos – se bem que hoje, os pedágios), mas da cebola, do repolho, pepinos, e muitos produtos da região, inclusive lembro, da área rural de Pelotas. É um modelo (agro-fabril, por aí), mas há muita gente ou poderosos poucos que não querem. Juntar-se-ia, agora, às idéias de cooperativismo, associativismo, mas – se fosse para “empresariar” os filhos do município, já os do mal ambiental dos pinus, por certo teriam incluido TODA TERRA do município para alternativa agrícola, privilegiando aos que deveriam deter por um tipo de direito mais natural, aliás, o modelo foi de incenticos fiscais e tudo mais a quem, para iniciar, juntou terras de Osório ao Uruguai – deserto verde. A PROGASA também poderia tirar S. J. Norte do mal da monocultura. Meu trabalho de Economia – UFGRS – foi resumo destas idéias, muitas, demais, a diminuir, pelo meu orientador. Falando em memória coletiva, nós, restinguenses nortenses, temos um contingente muito individualista, o que em princípio nega meus argumentos sobre associativismo (um, uma enxada, muitos, um trator). Por outro lado, sempre que posso, coloco minhas idéias nos coments do Jornal Agora, quando o assunto é similar, só que, a página sobre SJNorte é objetivamente política, só permanece por alguns dias aquilo que elogia “os atuais”, logo somem com meu assunto, muitas vezes contraposto com diálogos de agricultores que comparecem apenas para dizer “que não dá mais, plantar cebola”.
Aguardo ver se você está no ar, para ler o conteúdo acima.
João Carlos Guimarães da Silva