Xinguanos aproveitam festival tradicional gaúcho realizado em Canarana (MT) para apresentar sua cultura e mostrar que o convívio entre brancos e índios pode – e deve – ser harmônico.
Produzidos com colares, cocares e pinturas corporais, 40 indígenas do Parque Indígena do Xingu (MT) apresentaram um pouco de sua cultura na II Etapa do Circuito Femart (Festival mato-grossense de Artes e Tradições Gaúchas), no dia 28 de agosto, em Canarana (MT). Liderados pelo professor indígena e diretor da Atix (Associação Terra Indígena do Xingu) Mutuá Kuikuro, os xinguanos pararam o baile e chamaram a atenção das 400 pessoas que lotavam o Centro de Tradições Gaúchas (CTG) Pioneiros do Centro-Oeste.
No ano em que o Parque completa 50 anos de criação, esta foi uma oportunidade dos índios mostrarem um pouco da sua cultura aos vizinhos da cidade. Em breve discurso, Mutuá ressaltou o histórico de conflitos entre brancos e índios. Lembrou a todos os presentes – em sua maioria de origem europeia – que “os índios não gostam dos brancos e que os brancos não gostam dos índios”, mas que havia ali uma oportunidade de mudar esse cenário. A inesperada fala arrancou muitas palmas da plateia, e com um clima que variava entre “admiração e incômodo”, conforme relata Rodrigo Junqueira, coordenador adjunto do Programa Xingu, do Instituto Socioambiental (ISA), os índios dançaram durante 30 minutos para o público presente no CTG. “O público presente assistiu a tudo com respeito e atenção Em tempos de tensão, posições polarizadas e ânimos acirrados sobre o Código Florestal, Unidades de Conservação e Terras Indígenas foi algo impressionante de ver”, diz.
A maior parte dos xinguanos pisou num CTG pela primeira vez e a troca cultural foi intensa: mistura de culturas, símbolos, indumentárias. Lá, eles puderam conhecer um pouco mais das tradições gaúchas, com as prendas de vestidos rodados de manga longa e com peões de bombachas, guaiacas, lenços e esporas. Aprendizado e conhecimento mútuo.
Para José Mitielo, vice-patrão do CTG, a experiência foi única e permitiu uma troca ainda não vista na região. “Eles são nossos companheiros na cidade e muita gente não sabe nada sobre eles. Daí surgiu a ideia de trazê-los para o encerramento do nosso festival. Foi um momento maravilhoso. E o principal é que muita gente passou a olhar diferente para os índios depois disso, com mais respeito. E esse era o nosso objetivo, começar uma aproximação entre essas duas partes e deu certo”, conta.
Sinal de que uma semente para o convívio mais harmônico foi plantada veio ao final do encontro, quando uma jurada do festival, trajada tipicamente, pediu desculpas, como descendente de europeus, pelas barbaridades que ocorreram ao longo da história contra os indígenas. Marioni Fischer veio de fora para o evento. Ainda mora na região Sul e ficou encantada com a vibração dos xinguanos em suas apresentações. Formada em dança, ela vê na marcação das batidas dos pés dos índios sua forte relação com a natureza. “Desde criança tenho interesse na cultura indígena e poder ver esta apresentação foi um presente. É uma manifestação tão diferente da nossa cultura europeia. Fica claro na dança deles a relação com a terra. Isso é tão forte. E a gente se afasta tanto das nossas raízes, do que importa realmente. Foi de fato um presente poder presenciar tudo isso.”
Em outubro, a população canaranense terá ainda mais uma chance de conhecer parte da história dos xinguanos. Depois das comemorações dos 50 anos do Parque Indígena do Xingu realizadas na aldeia Ipavu, do povo Kamaiurá, e em São Paulo, na Cinemateca, será a vez da pequena cidade matogrossense receber a exposição fotográfica Xingu + 50. A mostra, organizada pelo ISA, retrata passado, presente e propõe um debate sobre o futuro da primeira grande terra indígena demarcada no País.
ISA, Christiane Peres.
Fonte: http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3401
Enviado pelo Dr. Rogério Reus
Professor e Coordenador do Colegioado do Curso de Antropologia UFPel/RS
Coordenador do NETA – Núcleo de Etnologia Ameríndia
Vice-Coordenador do NECO – Núcleo de Estudos sobre Populações Costeiras Tradicionais – FURG/RS