I Semana dos Povos Indígenas FURG – Rio Grande

Texto de Cátia Simone Silva
Discente Bacharelado Antropologia Social – UFPel

No primeiro dia da Semana dos povos Indígenas, na roda de diálogos, foi tratado o tema sobre Saúde Indígena no RS , o Sr. Augusto (Kaigang) nos fez refletir sobre como era e como está a saúde do seu povo, conta que antigamente a mãe terra fornecia alimentos, frutas, tinham uma alimentação mais natural, faziam do uso da medicina natural, tinham as parteiras e os Kuyás. Mas diz Augusto: “Foi mudando, o modelo capitalista imposto pelos orgãos do governo não respeitou as nossas sementes, nossas bebidas, eles quiseram que nós virássemos o modo capitalista deles, trouxeram remédios, comprimidos para nossas mulheres não terem mais filhos”. Comenta que os órgãos governamentais queriam excluir os saberes tradicionais dos indígenas.

No período da SPI, Serviço de Proteção ao Índio, fundado em 1910 dentro de orientações traçadas por Cândido Mariano da Silva Rondon, que se destacou na obra de pacificação e respeito ao índio,  um de seus primeiros trabalhos foi a pacificação dos índios bororos, entre Cuiabá e Araguaia, tinha como lema “Morrer se preciso for, matar nunca.” Infelizmente, depois de Rondon, o SPI perdeu-se em escândalos e foi extinto em 1967, dando lugar ao aparecimento da FUNAI (Fundação Nacional do Índio).  ( Adas 1982, Pag. 133 e 134)

imagens 017
Sr. Augusto Silva (Kaigang) – Terra Indígena Irai

O Sr. Augusto comenta: “No período do SPI eramos forçados a plantar soja, a produzir a monocultura,  acabaram com a vida dos povos indígenas, neste período do SPI, os kuyás eram proibidos de fazer remédios, as parteiras não podiam exercer as suas funções, as nossas ervas curavam todas as doenças que tínhamos e a fumaça também curava, isto não foi respeitado pelos órgãos do governo, as águas também eram mais puras. Quando havia a fonte natural não existia pressão alta e outras enfermedidades que apareceram.”

Falou que todos os órgãos diziam que as ações eram para melhorar a vida dos índios, mas ainda hoje os agentes de saúde proibem  o uso das ervas medicinais, comentou que com as ervas as mulheres indígenas faziam o pré-natal, este saber ainda está vivo, é só revitalizar. Hoje estes saberes estão voltando, porém o  Sr. Augusto acha que ainda falta por parte do governo, através dos seus agentes de saúde popular a inclusão da medicina natural.

Diz: “Quando pedimos a Funasa para usar ervas, eles colocam profissionais brancos e não índios para trabalhar com a saúde indígena. As ervas curam não por alguns minutos, mas por muito tempo”, e comenta que irão continuar usando as ervas e as plantas nativas. Salienta que os enfermeiros e os médicos deveriam pensar na saúde do povo indígena.

Augusto deixa uma proposta para que os estudantes e as universidades;  “Que estes venham juntar-se as causas indígenas” e propõe projetos de pesquisa junto as aldeias para melhorar a qualidade da educação e a saúde de seu povo.

imagens 013

Letícia, Yasmin, Cátia, Leonardo e Liza

Para Leonardo Werá Tupã, guarani da Aldeia Araçaí localizada no Paraná, somos todos iguais independente da cor, o que varia de uma pessoa para outra é o coração, muitas tratam os índios com carinho e respeito e estão preocupadas com as suas causas, mas ele nota que muitas pensam logo em ir embora, e não conversam, não procuram saber mais.

O que modifica é a estrutura cultural e a medicina, comenta que “todos gostam de ser bem tratados e então ficam pensando que isto é para todos. Na estrutura indígena não tem muita concorrência, hoje somos pobres quanto ao conhecimento, toda a estrutura desse conhecimento foi devastado, como se um meteoro caísse, e assim aconteceu com os povos indígenas, com os seus valores.”

Salienta  que hoje os indígenas passam por uma consequência deste trauma que atingiu a estrutura familiar e social, sendo uma consequência muito forte para a família indígena, diz que ele próprio era muito revoltado, não gostava nem de falar com os brancos, mas sua avó disse-lhe que isto era muito feio, pois nem todas as pessoas são assim. Observa que esta faltando uma divulgação do jeito de ser indígena e também descobrir como é o jeito do outro, pensa que ambos devem pesquisar as culturas. Na cultura indígena não existe divisões de classe: média, baixa, alta, mas acredita que com o convívio isso irá modificar.

Hoje por falta da floresta, das plantas, de um profissional na aldeia com conhecimentos para passar e com o espaço diminuído, os indígenas estão perdendo o seu jeito próprio de viver, tanto na saúde como na agricultura estão  encontrando dificuldades.

Acredita que todos devem pensar como ajudar os outros, e isso em todas as áreas, os indígenas possuem o conhecimento do meio ambiente, outro que possua conhecimento em  geografia por exemplo poderia explicar aos indígenas o que eles não sabem. Nesta  parte do diálogo fica explícito a questão do coletivo, uma das características principais dos povos  ameríndios. Ele próprio fez pesquisas para falar neste evento, e pensa que ambos devem procurar o conhecimento, e que o próprio indígena deve se preparar para entrar na universidade, mas tem que ter certeza e procurar concentração e dedicação em tudo que faz. Como professor acha que assim vai ter retorno de alguma forma, esta vendo o esforço da modificação na saúde, mas salienta que ainda não está tudo bem,  diz que tem que avançar mais.

Em 1990, foi implantado o SUS nas aldeias indígenas, a partir dai, foi dividido em distritos dentro dos estados, através dos agentes de saúde criaram as casas de saúde para os indígenas, e os órgãos governamentais passaram a pensar mais na temática indígena. Leonardo nos deixa algumas perguntas para refletirmos: “Será que todo o planejamento referente a saúde dos povos indígenas realmente está acontecendo? Como os enfermeiros e os médicos estão fazendo, será que é a forma correta? E o que pode ser feito para que os alunos saibam tratar a realidade das comunidades indígenas?”

Em 2010 a FUNASA passou para outra secretaria a questão da saúde indígena, isso deu-se devido a reinvidicação de todos os povos ameríndios, Leonardo diz : “A FUNASA tercerizava, e isto causava uma condição diferente no tratamento, também havia a questão da corrupção, pois quando chegava na aldeia, os remédios já tinham ficado pela metade, acredita que com a secretaria isso irá mudar. Quando a FUNASA queria construir um posto de saúde, não encontra terra livre, vê isso como um obstáculo, e a legislação muitas vezes dificulta não permitindo.”

Werá Tupã destaca que “pensando na lei da Constituição Federal, onde está o atendimento diferenciado?” Expressa o seu desejo de que as lideranças possam botar no papel o tipo de saúde para eles, e que faltou o governo colocar em prática a saúde diferenciada. Os caciques querem discutir a criação, mas o governo não quer, os médicos e os enfermeiros não fazem atendimento diferenciado, apesar do SUS dizer que os índios tem direito de atendimento diferenciado em qualquer parte do Brasil, isso não esta sendo praticado, precisamos ver como será executado este tipo de saúde.”

Pensa que as lideranças devem com ajuda dos amigos, colocar no papel o tipo de saúde que querem. Comenta que será mais uma barreira para os indígenas enfrentar, e que deveriam pensar junto as universidades como isto poderá mudar, pois o estudante indígena que está na universidade por exemplo, irá continuar valorizando a sua cultura e também a medicina ocidental.

Pensa que todos os povos devem se respeitar e dialogar muito, e assim deve acontecer com todos,  não discutir e deixar por aqui, mas revitalizar a cultura da medicina natural, e também na educação, pois ressalva que a cultura indígena está viva. Cita como exemplo ele próprio e o Sr. Augusto, que possuem muita informação para passar.

imagens 010

Letícia, Yasmin e Cátia

Dia 05 de outubro, felizes aguardando a carona do prof. Rogério para irmos a I Semana dos Povos Indígenas na FURG em Rio Grande/RS.

imagens 020
Prof. Rogério e as alunas do curso de Antropologia/Arqueologia e do NETA – UFPel

O Grupo de estudos do NETA – Núcleo de Etnologia Ameríndia da Universidade Federal de Pelotas, estava presente no evento, nosso objeto de estudo são as sociedades ameríndias, o coordenador dos estudos é o prof. Rogério Reus, juntamente com o prof. Claudio Carle e a profa. Lori Altman, as reuniões do grupo acontecem as quinta-feiras pela manhã no ICH, a todos os interessados, fica o convite para participar.

One comment

  1. Muito bom o texto sobre o evento.Pena que não pudeste estar presente nos outros dias.Aconteceram debates e críticas pesadas de jovens indigenas que se dizem “misturados”estes se sentiram excluído dos debates e dos projetos elaborados pelas lideranças indígenas presentes.Um dos motivos da exclusão segundo eles seria o fato dos caciques exigerem que a prova para o ingresso na FURG serem efetivadas na língua Kaigang(O justo segundo eles seria belígue).Mais detalhes posso mandar em texto e video ,Ok
    Magoei eu e os colegas da “antro” que não aparecemos na foto e nem fomos citados..somos indios misturados também?.. rs,rs,rs.By

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *